Gosto muito de sair de noite às escondidas,
sentar-me num degrau da escada, passar horas contando estrelas. Porque nesses
momentos, geralmente e de repente nascem diálogos comigo mesmo (comigo mesmo é
redundante, mas é usual), e há diálogos que só posso travar comigo, ninguém
mais entenderia.
Gosto de ouvir o silêncio e os ruídos da
noite. Eles sintetizam o som de todas as vozes e melodias cósmicas produzidas
por gentes e não-gentes, presentes e ausentes; por anjos e não-anjos,
ascendentes ou cadentes; por meteoros e universos.
Gosto de conversar com gatos que visitam
meu telhado e muros (com os cães, à noite não muito, eles tornam-se menos conversadores).
Gosto de falar com cachorros durante o dia quando se tornam mais espirituosos pois
nos dão verdadeiras lições sobre como ser indiferentes ao que não é da nossa
conta, como ser sinceros, quando defender atacando e quando evitar riscos
fugindo deles.
Não gosto de pessoas que falam alto,
que me interrompem, invadem meu espaço com seus narizes quase roçando no meu
(rostos muito próximos, pele com pele só têm sentido se for para troca de
carinhos, de calores eróticos); detesto falar com as que repetem sempre as
mesmas coisas e também com aquelas que amam contar seus feitos heroicos ou
gloriosos.
Nas tragédias e mitologia antiga há espaços para heróis, há coerência. Fora disso não sei o que é alguém ser herói. Glória também é uma consagração
incompatível com seres humanos; é uma palavra, um estado, elevação que combina,
no meu modo de ver, com divindades; não me soa como algo do mundo de pessoas
materiais.
Sinto falta de pessoas que conversem como o
murmúrio da escuridão, como os gatos à noite e os cães durante o dia. Um tipo
de pessoa que numa palavra ou num olhar consiga emitir o mistério do aummmmmmmm
dos monges das montanhas ocidentais.
Prefiro falar com estrelas ou com gente que pareça um
pouco estrela, um pouco mosteiro, um pouco noite, gato, cão: pessoas que ecoem melodias de seu interior.
Gilberto Leite
gilbertopleite@hotmail.com
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